Por que o constrangimento em reconhecer que Anderson é gênio?

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Anderson e Chael Sonnen se cumprimentam após a vitória do campeão no 2R, no UFC 148, em Vegas. Foto: Josh Hedges/Zuffa LLC/UFC Divulgação

Anderson e Chael Sonnen se cumprimentam após a vitória do campeão no 2R, no UFC 148, em Vegas. Foto: Josh Hedges/Zuffa LLC/UFC Divulgação

Craque. Mito. Único. Gênio. Adjetivos reservados a pouquíssimos atletas que alcançaram o auge em suas modalidades. Quando se fala de MMA, essas denominações aplicam-se perfeitamente para Anderson “Spider” Silva. Por que não dizer? Qual o constrangimento em reconhecer um gênio? Que outro lutador mereceria mais esse reconhecimento do que o campeão dos médios? Dana White disse, recentemente, que “lidar com Anderson é como lidar com um artista”. Está certo. Anderson levou a outro patamar o termo “arte” marcial. Ele é um artista, com tudo de bom e de ruim que isso implica.

Anderson Silva fez e faz coisas inimagináveis no octógono. Movimentos fluidos, plásticos, precisos, confiantes, eficientes. Suas lutas são empolgantes e imprevisíveis. Você nunca sabe qual truque ou qual comportamento ele irá apresentar. Como ele irá nos deixar estupefatos dessa vez? Só os grandes artistas são capazes de nos maravilhar ou chocar em cada apresentação.

Ainda assim, não falta quem critique ou torça para que Anderson Silva perca – mesmo no Brasil. Na minha opinião, estes não compreendem que os artistas têm sua própria lógica. Só Anderson sabe o que o levou ao comportamento imaturo contra Demian Maia. A máscara usada na pesagem do UFC 126 para encarar Vítor Belfort foi para intimidar ou foi uma brincadeira? Ninguém esperava a “ombrada” no rosto de Chael Sonnen antes do UFC 148. E muito menos que, após a vitória, em vez de tripudiar sobre aquele que tanto o havia irritado, o campeão usaria a mais fina ironia para convidar Sonnen para um churrasco e dizer que sua esposa iria cozinhar para eles. Anderson parece sempre fazer questão de surpreender e chocar, dentro e fora do octógono. Isso desagrada muitas pessoas.

Outros mitos do esporte também tinham suas imperfeições. São notórios o alcoolismo de Garrincha, a toxicomania de Maradona, a arrogância de André Agassi, a boemia de Romário, a língua afiada de Muhammad Ali, a competitividade compulsiva de Michael Jordan, a falta de modéstia de Pelé. Traços controversos que não empalidecem o brilhantismo de cada um.

Relembrando algumas das façanhas do “Spider”, dá para negar que ele é extraordinário? Reveja as bombásticas joelhadas aplicadas para nocautear Carlos Newton, Chris Leben e Rich Franklin (duas vezes). As esquivas inacreditáveis nas lutas contra Griffin, Okami e Sonnen. Os socos que demoliram Forrest Griffin com a precisão de mísseis teleguiados, direcionados ao ponto exato para nocautear sem necessidade de força bruta. O chute frontal no queixo de Vitor Belfort, hoje um dos lances mais famosos da história dos combates, mas surpreendente e inédito no momento em que foi aplicado. Muitos enaltecem as cotoveladas de Jon Jones, mas nenhuma delas tem a beleza da cotovelada reversa utilizada pelo brasileiro para nocautear Tony Fryklund no Cage Rage 16.

A postura majestosa e confiante de Anderson Silva assemelha-se muito à descrição de Pelé feita pelo escritor Nelson Rodrigues, em 1958, na crônica “A realeza de Pelé”, publicada originalmente na revista “Manchete Esportiva”:

“Meu personagem anda com uma dessas autoridades irresistíveis e fatais. Dir-se-ia um rei, não sei se Lear, se imperador Jones, se etíope. (…) Em suma: — ponham-no em qualquer rancho e a sua majestade dinástica há de ofuscar toda a corte em derredor. (…) Já lhe perguntaram: — “Quem é o maior meia do mundo?”. Ele respondeu, com a ênfase das certezas eternas: — “Eu”. Insistiram: — “Qual é o maior ponta do mundo?”. E Pelé: — “Eu”. Em outro qualquer, esse desplante faria rir ou sorrir. Mas o fabuloso craque põe no que diz uma tal carga de convicção, que ninguém reage e todos passam a admitir que ele seja, realmente, o maior de todas as posições.”

Se Pelé era “o gênio dentro das quatro linhas”, Anderson Silva é o “gênio das oito linhas” do octógono do UFC.

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