O lado fã de quase todos nós aplaudiu a atitude do árbitro ao desclassificar os dois finalistas do absoluto faixa-marrom do WPJJC de Abu Dhabi. Isso porque o que todos nós queríamos era assistir a uma luta eletrizante, com idas e vindas, destes dois grandes lutadores de Jiu-Jitsu.
Acontece que nem sempre embates entre dois grandes lutadores se traduzem em grandes lutas.
Alguém se lembra dos momentos que antecederam a luta entre BJ Penn e Matt Serra em setembro de 2002? A maioria aguardava o maior combate no solo da história do UFC. E o que se viu foi uma luta travada em pé, que, aposto, nenhum dos dois campeões considera estar na lista dos seus melhores momentos.
É apenas um exemplo entre tantos. Fabio Gurgel e Amaury Bitetti lutaram incontáveis vezes nos anos 1990, e raramente a luta deles era resolvida por mais que dois pontos. O mais interessante é que a maioria criticava duramente a técnica do eventual vencedor (Amaury, na maioria das vezes), mas a razão de a luta ser travada era porque o nível técnico de ambos era altíssimo e equivalente, e não por ausência de técnica como se fazia crer.
Mesmo um dos maiores finalizadores do fim da década de 1990, Nino Schembri, se viu segurando a luta em combate que abriu cinco pontos contra outro monstro da finalização, Fernando Margarida, em luta casada realizada em São Paulo.
E até aquele que é possivelmente o maior finalizador da história do Jiu-Jitsu de competição, Roger Gracie, passou bons momentos “descansando” na guarda fechada de Marcus Buchecha, durante o confronto dos dois no Metamoris, simplesmente porque era o mais prudente a se fazer naquele momento.
Precisamos distinguir valentia de inteligência e estratégia, e não estimular a valentia desmedida, beirando ao suicídio.
Novamente, é mais fácil ao não assistirmos a Keenan Cornelius e Paulo Miyao entrarem para matar e morrer que nossa frustração de fã se reflita num lado perverso de comemorar a desclassificação de ambos.
Mas, concorde você ou não com a atitude do juiz, não é justo passar a julgar o Jiu-Jitsu destes dois atletas pela luta de um contra o outro, e usá-la para desconstruir as qualidades técnicas de ambos.
Lutas parelhas e monótonas não são privilégios da atual geração, sempre existiram e sempre vão existir. Mas se você quer analisar a técnica e o ímpeto dos dois melhores faixas-marrom da atualidade, faz mais sentido observar suas lutas contra outros adversários.
Notará, pois, que Paulo impressiona domando monstros muito além dos seus 61kg desde que era faixa-azul, e que o percentual de finalizações de Keenan Cornelius é tão alto quanto notáveis antecessores dele na faixa-marrom, jovens reis da categoria como Ronaldo Jacaré, Márcio Pé de Pano e Fernando Margarida.
Sequer conheço pessoalmente Keenan e Paulo. Mas admiro o Jiu-Jitsu que eles apresentam, muito além do que é percebido no confronto direto entre os dois.
*** E você, leitor, qual sua opinião sobre a desclassificação? Comente.