O Mundial de Jiu-Jitsu de 2006 foi o de Xande Ribeiro. Derrubando as probabilidades, ele venceu o favorito Roger Gracie para sentar no trono absoluto faixa-preta daquele ano. No Tijuca, no último ano que o Mundial seria sediado em seu lugar de nascimento, Xande pescou o ouro usando as quedas como seu grande trunfo, em especial na final contra Roger.
O caminho de ambos na final não foi moleza. Roger começou estrangulando Zumbi Lara pelas costas, e então pegou Rodrigo Cavaca no triângulo. A semifinal foi contra Marcelinho Garcia, e foi reportada na GRACIEMAG #114:
Em pé, Roger viu o peso médio da Alliance tentar laçar suas pernas na intenção de puxar para a guarda. Roger manobrou e fintou para a meia-guarda, e passou aos 3min27s. Marcelinho tentou escorregar para fora da zona de perigo, mas assim que conseguiu fugir da montada, deixou as costas livres para o oponente. Roger subiu em Garcia, que já estava com a barriga no solo, usando os ganchos para ‘espalhar o frango’ e pegar o pescoço aos 5min22s. ‘Este ano ele me deu menos espaço ainda’, disse Marcelo, sem deixar de sorrir.
Xande teve três lutas antes da final pelo ouro. Primeiro enfrentou o recém graduado faixa-preta Tarsis Humphreys e goleou por13 a 0. O oponente seguinte foi Romulo Barral, que começou na frente com uma raspagem. Xande raspou de volta, passou e chegou à montada, de onde estrangulou Rominho. O grande momento da final chegou com outro estrangulamento da montada, desta vez sobre Roberto “Cyborg” Abreu, que havia derrotado Bráulio Estima e Demian Maia, hoje astro do UFC.
A final seria eletrizante.
A luta entre Roger Gracie e Xande Ribeiro começou com total ação em pé, num duelo de pegadas tão fortes que Xande por pouco não ficou sem a parte de cima do kimono. Roger se desvencilhava resistia às investidas de Xande e, com um de-ashi-barai, derrubou o mais jovem dos irmãos Ribeiro aos 7min30s. “Nessa hora o Alexandre começou a se recuperar’, narraria Saulo depois. Roger tentou a guilhotina, puxou para a guarda e a arbitragem viu dois pontos. Empate. Xande então foi para a meia-guarda, ganhou a vantagem e Roger repôs a guarda.
Exatamente quando Saulo gritou da grade, “Mantém, ele vai se desesperar”, aos 5min, Roger voltou a ter a vantagem: com uma omoplata sensacional, fez o faixa-preta da Gracie Humaitá virar, consolidando a raspagem: 4 a 2 para Roger. Com 3min30 para acabar, o vice campeão de 2003/04/05 tentava a finalização, para coroar sua campanha perfeita até então. No chão, ele segurou nas costas do adversário, repousou sua cabeça e respirou, como se agora fosse enfim deixar o relógio correr e fazer o seu trabalho.
Mas Roger não é assim. Ele manteve a luta aberta e foi para cima para pegar. Tão aberta que, faltando 40 segundos para o fim, ambos se levantaram. Poderia um raio cair duas vezes no mesmo lugar? A resposta veio rasgando como um relâmpago e ecoando o grito da torcida: da grade, Saulo executou um ippon-seio-nage no ar e gritou: “Derruba!”
Como por telepatia ou outra forte conexão entre irmãos, Xande repetiu o gesto de Saulo no dojô e pegou a gola de Roger.
O que houvera? Ao notar as costas do rival desprotegida em pé, o Gracie viu a chance de prender os ganchos e atacar o pescoço. O instinto finalizador o traíra por uns segundos.
Roger foi ao chão. Urros e um barulho dos diabos na arquibancada. O árbitro Muzio De Angelis levanta dois dedos. O relógio marca 15s de sobra. Xande puxa para a guarda fechada com o sorriso querendo explodir. Acaba o tempo. Fim de luta e do campeonato: 4 a 4 na pontuação, uma vantagem para Roger e duas para o novo rei Alexandre. Após um longo abraço em Saulo, Xande definiu o golpe mais celebrado de sua vida: “Foi um wasari, um tiro perfeito”.