A sala Copacabana do hotel JW Marriott, na orla do Rio de Janeiro, costuma abrigar cadeiras, uma penca de engravatados e slides para reuniões de negócios. No início de dezembro, contudo, estava com tatames, dezenas de garrafas de água e copos de mate, além da bela vista para a praia. A equipe GRACIEMAG chegou ao hotel nos momentos finais da aula sem kimono ministrada por Caio Terra para os mais de 60 alunos de seu camp, praticantes e competidores vindos dos EUA, Japão e Rússia.
Fora o professor principal, as aulas também era dadas por Kim Terra, Rudson Mateus e um certo peso-pluma que caminhava pelos cantos do tatame. Olhos menos treinados certamente deixariam passar batido o atual bicampeão mundial Michael Musumeci, com seu jeito reservado.
Com um abano, nossa reportagem “tentou” trazer o mesmo para um papo. Musumeci não deu bola, mas depois de recolocar seu par de óculos o mesmo ficou mais simpático. “Não enxerguei você!”, disse em tom de desculpas o míope dono de uma visão ampla de Jiu-Jitsu.
Hoje com 22 anos, Musumeci (fala-se Muzumichi) correu desde novinho atrás do sonho de ser campeão mundial de Jiu-Jitsu. Sua jornada começou em 2012, com o primeiro ouro no juvenil faixa-azul, e todos os anos seguintes foram no topo do pódio – até que, em 2017, o americano se embolou com João Miyao para conquistar o Mundial como faixa-preta. Se foi sua maior felicidade da vida? Pior que não, ao contrário.
“Eu não me senti feliz ou realizado”, disse Musumeci, para espanto daqueles que ouviam. “Trabalhei muito para chegar naquele dia, desde os 12 anos de idade, e não aproveitei nada. Não estava feliz. Consegui e pensei, o que faço da minha vida agora? Eu tinha tanta coisa na cabeça, e do nada era o fim. Uma semana depois do Mundial eu não tinha vontade de fazer mais nada, de treinar ou vestir o kimono. Eu estava deprimido, achei que nunca mais ia competir. Foi muito traumático. Eu sou introvertido, nunca tinha feito uma superluta, e todos os holofotes em mim naquele momento me trouxeram uma sensação ruim.
“Mas tudo mudou assim que conversei com o Caio e outras pessoas próximas”, revela a fera. “Pus na cabeça que ia treinar por diversão apenas, sem a pressão de competir ou vencer. Quando eu era criança eu treinava por hobby. Comecei a ir para a igreja e treinar para me divertir. Meus nervosismos sumiram e me tornei um atleta muito melhor.
“Se você reparar minhas duas versões do título, em 2017 e 2018, são dois atletas diferentes. Em 2017 eu estava sério, travado. Tão nervoso que mal conseguia pensar ou aproveitar. Só não digo que foi o pior torneio da minha vida porque eu ganhei. No Mundial deste ano eu estava tranquilo, sorrindo. Eu estava me divertindo. Coloquei na cabeça que se fosse para ganhar ou perder eu queria me divertir, sem pressão. E foi o melhor torneio da minha vida.
“Na final contra o Ary Farias, por exemplo, a minha mente se desligou. Eu não estava ali, era como se estivesse vendo a luta da arquibancada. Quando retomei a consciência estava nas costas do Ary. Eu não sabia como tinha feito aquilo, estava em outro mundo, viajando. Na filmagem olhei em volta, sem saber como tinha feito aquilo. Senti que poderia buscar a finalização, faltavam três minutos no cronômetro da final, mas eu queria aproveitar aquele momento que eu não tinha curtido em 2017. Foi muito legal.”
Depois de lembrar com carinho dos momentos no Mundial de 2018, nossa equipe foi almoçar com Musumeci, Caio, Rudson e os atletas do camp. Para Musumeci, nada além de arroz, feijão e farofa, em dois pratos fundos, com poucos pedaços de carne. “Estou comendo só isso por uma semana, eu amo arroz com feijão. E, por incrível que pareça, perdi dois quilos! A comida no Brasil é muito saudável, diferente dos alimentos processados dos EUA. O açaí também, é o melhor do mundo!”