Nascido em 21 de novembro de 1937, Flavio Behring começou a treinar com 10 aninhos, por incentivo do pai, o velho jornalista Sylvio Behring. Seu primeiro dia de kimono já é de causar inveja: deu uma queda no todo poderoso Helio Gracie, no dojo armado na casa do saudoso grande mestre, na praia do Flamengo, no Rio.
O pequeno Flavio nada sabia de lutas, claro, e o mestre só queria mostrar como aquela ciência chamada Jiu-Jitsu possibilitava a uma criança derrubar um adulto. Deu certo. Após décadas de muito estudo, o paixão de Marcelo e Sylvio Behring tornou-se um faixa-vermelha respeitado – condecorado faixa-preta pelo próprio Helio, nos idos de 1955. “Isso ocorreu aos 17 anos, eu era instrutor da academia e usava a faixa-azul clara própria dos instrutores, mas nesse dia o professor pegou a faixa-preta dele e me deu”.
A história de Flavio Behring começou como a de muitos alunos. Ele era uma criança asmática e vulnerável, com total aversão a exercícios e contatos físicos. Mas, após sofrer um bullying violento na escola, aos 13 anos – um tapa na cara de um colega mais velho, que ele inclusive admirava – foi salvo pelo Jiu-Jitsu. Ele mesmo contou, em entrevista ao GRACIEMAG.com:
“Foram dias terríveis na escola após aquele tapa. Até que um dia, eu estava na sala de aula, e aparece na porta o professor Helio Gracie. Ele já era uma personalidade reconhecida em todo Brasil, pelos seus feitos contados em revistas e jornais. O mestre pediu licença e anunciou que estava precisando da ajuda do ‘instrutor da academia’ dele, que estudava ali. Começaram os olhares incrédulos e os cochichos, e o professor Helio arrematou: ‘Saibam que o Flavio não reage a nenhuma agressão dos colegas porque eu o proíbo’. Era um grande psicólogo, né? E aí tudo mudou.”
Behring então ganhou atenção do jovem instrutor João Alberto Barreto, seu grande herói nas lutas e vale-tudos. Flavio lutou pela primeira vez com uns 15 anos:
“O professor Carlos me chamou e fomos para a antiga sede da ACM, no Castelo, no Rio. Eu achava que era uma exibição qualquer. Nada, era uma luta à vera contra um faixa-preta de judô, e fui empurrado para o ringue, pois minhas pernas não se mexiam, travei. Quando a luta começou, o camarada me arremessou de tudo que é jeito de costas no tablado duro, de um lado para o outro. Uma vez por baixo, imobilizado, eu de repente me lembrei de uma posição de autodefesa, fiz uma pressão no pescoço dele, um estrangulamento e o cara dormiu. Aquela finalização criou uma máxima que uso em cursos e seminários por todo o mundo: ‘Vence quem sabe finalizar, não basta imobilizar’”.
O velho Behring, Sylvio, admirador dos Gracie, foi diretor do jornal “O Globo”, mas mesmo assim a grande mídia ficou de mal com o esporte. “A partir dos anos 1960 e 1970 começaram a haver invasões de academia, o que por um lado reforçou a eficiência da arte, mas por outro passou uma imagem extremamente negativa em relação às artes marciais como escolas educadoras, respeitadoras e éticas. As invasões trouxeram antipatia”, explica mestre Flavio.
O mestre passou a trabalhar com publicidade e foi morar em São Paulo. Mas seguiu aprendendo, e ensinando: “A maior lição que aprendi nessas décadas é que os três tapinhas são a maior arma do praticante. Pedir para parar no treino não significa se acovardar. Significa que você encontrou o seu limite naquele dia, naquela posição, uma limitação emocional ou mesmo física – se o seu braço está envergado, desista, é melhor do que estalar e permitir um estrago. Saber dosar os treinos e não passar dos limites é o que eu indico. Não tenha vaidade, use os tapinhas e pare antes de se machucar. Essa é a salvaguarda do praticante. Além de entender isso, eu prezo por uma boa alimentação, uma ótima noite de sono. Muitas pessoas me dizem: ‘Mestre, quero chegar à sua idade igual a você’. Eu respondo: ‘Então comece hoje, pois já está tarde!’”