ADCC e Jiu-Jitsu: entramos na era da especialização?

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Gordon Ryan, a sensação do ADCC 2017, ataca Keenan Cornelius em disputa sem kimono. Foto: Gallerr.com

O americano Gordon Ryan, sensação do ADCC 2017, ataca Keenan Cornelius em disputa sem kimono. Foto: Gallerr.com

Por Jiuliano Leon *

Durante o ADCC 2017, a copa do mundo da luta agarrada realizada em setembro último na Finlândia, reparei que amigos se surpreendiam com as tantas vitórias de faixas-pretas até então desconhecidos dos fãs do Jiu-Jitsu esportivo. Eu, porém, preferi sorrir, aplaudir e dar os parabéns. Parabéns, comunidade do Jiu-Jitsu; seja bem-vinda à era da especialização no esporte.

O Jiu-Jitsu é um esporte curioso, pois é milenar ao mesmo tempo em que é jovem – em suas raízes, era praticado por samurais no Japão, enquanto o primeiro Mundial de Jiu-Jitsu brasileiro ocorreu em 1996. Sendo assim, segue caminhando a passos largos em direção à maturidade e à evolução, uma evolução que pode nem ter fim.

Sendo assim, será que foi mesmo surpresa ver algumas estrelas consolidadas do Jiu-Jitsu esportivo não tendo o mesmo desempenho nas regras e peculiaridades do ADCC? Será que atletas de menor expressão no mundo do kimono garantirem o pódio é uma zebra galopante?

Peço perdão mas tento responder com algumas perguntas:

Você apostaria seu suado dinheirinho em Usain Bolt numa corrida de 5 mil metros? Ou no nadador Michael Phelps numa prova de travessia marítima?

Eu não faria. E isso não quer dizer que o Bolt não tenha uma técnica perfeita nem que o Phelps não tenha treinado o suficiente. São especializações diversas.

Basta olhar ao redor para entendermos um pouco sobre esses caminhos paralelos do Jiu-Jitsu e do ADCC. Pensemos no futebol, por exemplo.

Talvez o leitor se lembre de como começou o futebol de areia no Brasil e no mundo. As primeiras seleções de futebol de praia (o beach-soccer, em bom português) eram formados por ex-craques do campo na faixa de 40 anos, que conheciam um pouco de praia, caso de Júnior e outros. Veio a massificação do esporte via Fifa e televisão, e surgiram jovens especializados no jogo de bola na areia, sem passagem nenhuma pelos gramados.

Outro exemplo similar vem do voleibol, onde campeões aposentados vestiam a viseira e garantiam troféus e vagas olímpicas entre as duplas de praia. Creio que até no tênis podemos traçar paralelos – há craques muito melhores no saibro do que na grama. Por fim, vale lembrar a evolução do MMA profissional: hoje ninguém pode imaginar que um craque do pano tire o kimono e conquiste do dia para a noite o cinturão do UFC, como nos anos 1990.

A conquista do absoluto por Felipe Preguiça, o novo supercampeonato de André Galvão e o tri de Rubens Cobrinha, claro, tampouco são surpresa, até pelo estudo profundo que os três têm da modalidade sem kimono. Os faixas-pretas que vestirem o kimono terão uma visão sempre mais abrangente, completa e inteligente das técnicas de chão. Mas o ADCC 2017 dá indícios que a dedicação e a especialização em cada modalidade serão um caminho cada vez mais rotineiro para quem quiser vencer naquela modalidade específica. É ver para crer no ADCC 2019.

Minha aposta: em dez anos, os campeões sem kimono serão totalmente diversos dos astros do Jiu-Jitsu esportivo. Indo mais longe, esses dois grupos de lutadores perigam desenvolver costumes, culturas, filosofias de treino e formas físicas diferentes – provavelmente notaremos, de longe, se aquele cara chegando é um atleta do Jiu-Jitsu ou do no-gi.

Bem-vindos à evolução e a profissionalização do esporte.


* Jiuliano Leon é professor de judô e Jiu-Jitsu formado na Alliance Rio.

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