Como ter uma pegada mais firme no kimono dos seus oponentes no Jiu-Jitsu

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Barral e Bernardo em foto de John Lamonica.

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Fazer pegada não se resume a “segurar pano”. Trata-se de um fundamento de técnica ampla e muitos macetes. Bernardo Faria e Rômulo Barral travam um debate revelador sobre o tema. Você lembra das principais atuações de Fernando Margarida nos campeonatos de Jiu-Jitsu?

Caso negativo, entre na internet e procure por vídeos sobre os combates históricos do faixa-preta. Repare como ele “grampeava” a gola dos adversários com estrangulamentos básicos, finalizando feras como Saulo Ribeiro e Fabio Gurgel. Outro grande exemplo de estrangulador implacável se chama Roger Gracie. Assim como Margarida, Roger reforça a velha máxima: “Se você deixa-lo enfiar a mão na sua gola, já era. Pode dar os três tapinhas”.

Além de muita técnica e preparo físico, há um fundamento primordial (embora subestimado) que contribui bastante para o sucesso desses dois craques mencionados acima: a boa pegada. Trata-se de uma pequena peça dentro de toda a engrenagem do seu Jiu-Jitsu. Uma peça que aparenta não ter grande importância. Porém, se você tirá-la da engrenagem, a máquina estanca. Por outro lado, se você lapidar essa pequena peça, seu Jiu-Jitsu vai alcançar enorme
progresso.

O lutador que possui uma pegada eficiente tem facilidade em diversas situações de um combate. Contra um oponente cascudo, seja na hora de fazer guarda ou passar, muitas vezes não há tempo para você segurar numa boa fatia de pano e se ajeitar. Pois, para quem tem “mãos de alicate”, basta catar um pedacinho de pano e é certo de que dali não soltará mais. Isso é uma vantagem danada, fundamental para o domínio do oponente e impor pressão. Esse é apenas um exemplo. Uma pegada vai otimizar a sua performance em praticamente todas as situações do Jiu-Jitsu com kimono. Ter a habilidade para grampear o pano inimigo é um trunfo para o seu jogo.

Foi por isso que GRACIEMAG convidou dois craques (de escolas rivais) para debaterem sobre esse tema. Rômulo Barral e Bernardo Faria oferecem a seguir todo o conhecimento que adquiriram fazendo pegada entre a elite do Jiu-Jitsu competitivo mundial. Confira!

GRACIEMAG: Afinal, pegada é uma questão de força ou de jeito?

RÔMULO BARRAL:
As duas coisas. Precisamos de força para evitar que estourem nossas pegadas. Precisamos de jeito para sentir o momento certo de relaxar e o momento certo de apertar, essa sensibilidade evita o cansaço. BERNARDO FARIA: Concordo. É questão de força e de jeito, porém, mais de jeito do que de força. Pegada não é só segurar no kimono do adversário e fazer força, há muita técnica e detalhes envolvidos, mas sem dúvida a força ajuda bastante.

Quais são as características de uma pegada eficiente? Como alcançá-la?

BARRAL: Pegada eficiente é a duradoura, a que resiste às tentativas de estouradas e abre espaço para o ataque. Quem faz a melhor pegada, no momento certo, está em vantagem. O segredo para alcançá-la é muito treino.
FARIA: Uma pegada forte vem acompanhada de uma técnica boa, então penso que o segredo é o mesmo de sempre: treinar muito e se dedicar muito, tanto na preparação física quanto tecnicamente. Se alguém tiver boas posições e um bom condicionamento físico, naturalmente terá também uma pegada eficiente.

Além do treino de Jiu-Jitsu em si, quais são os exercícios mais proveitosos para desenvolver uma boa pegada?

BARRAL: Gosto muito de fazer barras com kimono e subir corda. Também gosto de pendurar o kimono na barra e ficar segurando no pano pelo máximo de tempo que conseguir. Isso me ajuda a achar a minha zona de conforto quando vou lutar.
FARIA: O mais importante é sempre o treino de Jiu-Jitsu. Vejo muitas pessoas se preocupando além da conta com preparação física e musculação, entre outras coisas, e esquecendo o principal, que é treinar Jiu-Jitsu. Exercícios de musculação com o uso do kimono, fazer barra com kimono e essas coisas podem sim ser um complemento para uma boa pegada. Mas nada é melhor que o próprio treino de Jiu-Jitsu. Fazer pegada tem a ver com a arte de se acostumar à dor. É um fundamento que desgasta músculos, pele e articulações. Às vezes é difícil recuperar a pegada entre uma e  outra luta num campeonato.

Quais são os macetes que melhor funcionam para aliviar rapidamente o desgaste de dedos, mãos, pulsos e antebraços?

FARIA: A dor é muito comum após a primeira luta, porque o nosso corpo está com aquela adrenalina toda e, às vezes, acabamos nos desgastando demais no combate inicial. O que eu gosto de fazer para me acostumar a isso é tentar treinar cansado na academia. Quando sinto que já estou morto de cansaço, procuro fazer mais um ou dois rolas. Desse jeito me acostumo e aprendo a lidar com esse tipo de situação.
BARRAL: Entre uma e outra luta, quando se perde a pegada, o melhor a fazer é uma massagem no antebraço para relaxar os músculos. Durante o treinamento para campeonatos, alongo bastante os meus dedos para evitar as artroses. Massagear a mão também é muito importante e, para aliviar a dor, recomendo colocar água em um balde e encher de gelo. Deixe a mão lá dentro por 20 minutos, é muito bom e ajuda a melhorar as dores.

Romulo Barral em pegada firme na lapela de Murilo Santana. Foto: Gallerr

É recorrente ver lutadores entrando para competir cheios de esparadrapos nos dedos. Até que ponto isso pode prejudicar na hora de fazer pegada durante as lutas?

BARRAL: Acho que não prejudica. Tem gente que gosta de usar, às vezes ajuda um pouco na pegada, não sei… Uso às vezes para treinar, quando machuco meus dedos. Nas competições, não gosto de esparadrapos.
FARIA: Alguns lutadores fazem isso por estarem com os dedos machucados e aí o esparadrapo dá uma aliviada na dor. Outros fazem isso por sentir mais firmeza na pegada com o uso do esparadrapo. Às vezes, quando está muito frio, eu gosto de usar esparadrapo, porque no frio é muito comum machucar os dedos.

É preciso poupar a pegada dias antes da competição?

BARRAL: Com certeza! Próximo às competições é bom não treinar muito, não resistir às estouradas de pegada durante o treino e tomar muito cuidado com os dedos, porque vai precisar muito deles durante o campeonato.
FARIA: Excesso de treinos às vésperas do campeonato é um erro muito comum. Sempre quando vamos competir bate aquela sensação de que não treinamos o suficiente, e ai alguns tentam treinar mais e mais faltando poucos dias para a competição. Meu conselho é dosar a quantidade de treinos a medida que o campeonato se aproxima, para que se possa chegar no dia da luta 100% e sem lesões.

Em que posição é mais difícil para se fazer pegada? Por quê?

FARIA:
Isso depende de cada atleta. Por exemplo, para um judoca fazer pegada em pé é a coisa mais simples do mundo. Mas para alguém que não sabe judô, fazer pegada em pé pode ser muito difícil e muito desgastante.
BARRAL: É muito difícil fazer uma boa pegada na hora de passar uma guarda aberta. Nesse caso, primeiro temos que estourar a pegada do oponente, mas o bom guardeiro faz a pegada novamente, então exige muita velocidade e pressão para se chegar a uma boa pegada para passar a guarda.

Mangas, golas, lapelas, calça, faixa… Qual parte do kimono é mais difícil para se fazer pegada? Por quê?

BARRAL: A faixa. Durante a luta a faixa afrouxa, sai, então nunca se pode confiar nessa pegada.
FARIA: Também é muito pessoal, é de cada um. Quando o praticante fica um tempo parado, costuma-se dizer que ele “perde a pegada”.

Quais são as dicas para essa retomada, o famoso “recriar calos na mão”?

BARRAL:
Ficou parado, a mão perde os calos, a pele afina e a pegada fica fraca. A volta é cruel, os dedos ficam ralados na carne mesmo. Para recriar os calos, só voltando ao treino. Tem que segurar a dor da volta até se acostumar novamente e criar novos calos.
FARIA: Não se perde só a pegada, perde-se todo o condicionamento físico específico para o Jiu-Jitsu, e isso reflete bastante na pegada, porque no Jiu-Jitsu com kimono usamos as pegadas todo o tempo. Acho que o cara que estava parado tem que voltar aos poucos, sem se forçar muito no início para evitar as lesões. Na mesma medida que o gás e a movimentação vão voltando, as pegadas voltam também.

O estrangulamento de Bernardo Faria com pegadas fixas no pano. Foto: Ivan Trindade/GRACIEMAG

Até que ponto o psicológico do lutador pode influenciar na pegada? Tipo, lutadores inseguros tendem a não ter firmeza nas mãos? E os que têm medo são aqueles que não soltam o pano do kimono de jeito nenhum, perdendo mobilidade, gastam força e se tornam amarrões?

BARRAL: O psicológico pode afetar em tudo e a pegada não fica de fora. Você pode ter treinado, subido corda, feito barras com kimono, pode ter feito tudo certinho, mas se na hora ficar nervoso, achar que a pegada vai acabar, isso vai acontecer. Às vezes a pessoa fica com medo de perder a pegada boa, aí usa muita força e a pegada vai embora. Sem pegada, o lutador não tem nem condição de segurar a luta no momento oportuno.
FARIA: O psicológico está muito ligado ao condicionamento físico, sim, então está ligado à pegada também. Quando o atleta fica nervoso para competir, com muita adrenalina, acaba se desgastando demais nas lutas. Vejo muitos atletas assim por medo de perder ou pelo famoso medo de fazer feio no campeonato. Minha dica é tentar relaxar e pensar que todo mundo perde, só perde quem luta, então tentem apenas dar o máximo e fazer tudo o que puderem durante a luta. O resultado vai ser consequência da dedicação de cada um.

Você tem algum macete para não deixar o adversário quebrar a sua pegada? Tem algum macete para quebrar a pegada do adversário?

BARRAL: O que eu tento é antecipar a segunda pegada. Quando sinto que a pegada vai ser quebrada, uso a velocidade e procuro a segunda pegada para não deixar meu adversário me controlar. Quem tem a pegada melhor está em vantagem e vai estar na frente. O que eu uso para quebrar a pegada são pequenos movimentos de explosão, o famoso puxa-empurra.
FARIA: Procuro sempre tentar me antecipar à pegada dos adversários, porque se você deixar ele se ajeitar e fazer todas as pegadas, acaba ficando um passo atrás dele.

É comum num campeonato você dar o comando para a mão soltar ou apertar o pano e (em função do desgaste) ela não obedecê-lo? Como agir numa hora dessas?

BARRAL: Acho que é comum em lutas muito duras, que exigem muito da pegada. É preciso relaxar e achar uma posição de conforto, que não vá trazer perigo e dar uma relaxada nas mãos e antebraço.
FARIA: Acredito que isso acontece quando o atleta se cansa, aí sim acontece isso, a cabeça quer lutar mas o corpo não aguenta mais. Nessas horas, se desesperar só vai piorar a situação. O melhor é tentar se defender e não se desesperar em momento algum, porque o desespero vai te desgastar mais ainda. E para o próximo campeonato, tente se dedicar ainda mais, para que isso não aconteça de novo. Caso aconteça, que aconteça para você e o seu adversário ao mesmo tempo (risos)!

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