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Dicas de alta performance para atletas da categoria master, por Rafa Ribeiro

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O veterano Helvecio Penna em ação. Foto: FlashSport. 

 

Por Rafael Ribeiro*

Após a explosão do Jiu-Jitsu competitivo em todo o planeta, tornou-se crucial a classificação dos praticantes em níveis de competitividade. 

É comum, numa mesma academia, haver atletas em momentos de vida completamente diferentes, ambos objetivando o título mundial da IBJJF. Por exemplo: num mesmo dojô, um faixa-azul de 53 anos e um faixa-preta adulto, cada um à sua maneira desejando a respectiva glória no principal evento do grand slam do Jiu-Jitsu.  

Definir o perfil do atleta, portanto, é o ponto de partida de qualquer treinamento. Alguns atletas já me procuraram com o objetivo de serem campeões mundiais no adulto da faixa-preta, porém, com tempo e energia limitados para investir no processo que leva alguém a alcançar tal meta. Família, filhos e trabalho demandam um tempo que o atleta poderia estar investindo no próprio treinamento. Até mesmo o tempo para descansar pode ser um fator decisivo. 

Pensando nisso, elaborei cinco níveis de competitividade numa recente edição da revista GRACIEMAG. Minha ideia era facilitar o entendimento de onde cada um está e assim traçar alguns possíveis e concretos caminhos. Vamos então relembrar os cinco níveis: 

1- Praticante comum

É aquele lutador que frequenta a academia sem nenhum tipo de cobrança por resultados competitivos. Quando os colegas se animam para competir todos juntos, ele passa um mês treinando mais forte e até participa de um torneio local. Mas isso é algo esporádico, sem um planejamento prévio que envolva toda a temporada. 

2- Recreacional

Aquele que treina com um certo grau de preocupação com a performance. Alimentação saudável e preparação física, além dos treinos de tatame. Esse é aquele lutador que sempre disputa as competições locais e algumas até fora do seu estado. 

3- Amador

Aqui a vida já é de profissional e tudo começa a ser feito com planejamento. O lutador faz preparação física, tem nutricionista e fisioterapeuta, ambos desportivos, faz em média dez treinos por semana, somando os treinos de tatame, os drills e o treino físico, luta todos os campeonatos que pode e tem calendário estruturado com o objetivo final nos quatro grandes eventos da IBJJF (Europeu, Pan, Brasileiro e Mundial adulto ou master), mas não recebe salário para isso. Geralmente são os professores da modalidade e líderes de equipe. Aqui se enquadra grande parte dos integrantes das categorias master. Têm apoios pequenos de empresas e até para viagens, mas o seu sustento diário não provém das competições. 

4- Profissional 

Realiza tudo que um amador faz, porém, é pago para isso. Geralmente são aqueles atletas da categoria adulto, tanto na faixa-marrom como também na faixa-preta, já conhecidos pelo público e que sempre estão nos pódios das competições (sejam elas pequenas, médias ou grandes). Conseguem se manter de renda entre patrocinadores, premiações, aulas e também seminários. Diferente dos amadores, os profissionais têm essa última fonte de renda bastante estabelecida no mercado. Mas vivem com o orçamento sempre no limite e assim sendo não conseguem investir como gostariam no aumento da performance. 

5- Profissional de elite

São aqueles profissionais que estão sempre no topo dos campeonatos grandes. Os campeões mundiais da IBJJF e de grandes eventos com premiações altas em dinheiro. O que difere do profissional, além dos resultados, é a maneira que eles se propõem a fazer suas missões. Tudo planejado nos mínimos detalhes. A preocupação com a renda já não importa mais, portanto, a dedicação é exclusiva para o treinamento. A performance aqui também é alavancada por profissionais que fazem coaching. Neste estágio, a consciência de que todo e qualquer detalhe do dia a dia pode fazer total diferença é o grande trampolim para a glória.

Rafa Ribeiro puxando o treino de musculação de Isaque Bahiense. 

Geralmente os atletas da categoria master têm perfis que vão de “praticante comum” a “amador”. Existem algumas exceções, como os casos de alguns super campeões que lutam somente de adulto, mas já teriam idade (acima dos 30) para competirem na categoria master.

Existem também aqueles que lutam também ambas as categorias e estão no topo de cada uma. Verdadeiras pedreiras e que têm vida de atleta profissional ou fazem camps durante uma parte do ano, focados num determinado evento. A verdade é que com todo esse crescimento do BJJ como modalidade esportiva, o “mundo master” está cada vez maior, mais atrativo e também mais viável do ponto de vista financeiro. 

Pois bem, depois de determinar o perfil do atleta, o próximo passo é entender um pouco sobre o envelhecimento humano. Com o passar dos anos, nós perdemos algumas capacidades físicas, como força, velocidade e potência aeróbica. Perdemos também massa muscular e densidade óssea. E isso se dá em paralelo à diminuição da nossa capacidade de recuperação. Ou seja, precisamos ao mesmo tempo melhorar essas capacidades físicas e entender os mecanismos de recuperação muscular. 

Vamos analisar por tópicos: 

1- Tempo de luta 

Este é um fator decisivo, a progressiva diminuição do tempo de combate nos campeonatos: 10 min (adulto), 6 min (master 1), 5 min (master 2 em diante). Não vejo necessidade de atletas da categoria master treinarem com tempos de combate na academia superiores a 6 min. Esse é um ponto de partida importante para a prescrição do treinamento: diminuição dos tempos de rola/sparring diários para no máximo 5/6 minutos para os veteranos. Para os adultos, treinos de 10 minutos são fundamentais. 

2- Início de luta 

Com as lutas sendo mais curtas, começar na frente é uma estratégia que tende definir o resultado dos combates entre os veteranos. Então é de suma importância fazer treinos específicos de início de luta. Para quem tem um bom judô ou wresteling e até mesmo competiu nessas modalidades em algum momento, investir tempo em uma ou duas sessões de quedas por semana é muito bem-vindo para os competidores da categoria master.

3- Estilo de luta 

Geralmente as categorias da divisão master têm um modelo tático de luta mais parecido com o que se convecionou chamar de “old school”. Muita gente faz guarda fechada e meia, e passa com mais pressão do que velocidade. Então o primeiro ponto é estudar aquilo que a turma da sua categoria anda fazendo ou mesmo escolher um modelo que o seu corpo aguente. Fazer berimbolo todos os dias aos 50 anos pode ser bem prejudicial à sua coluna. 

Repare como é bem comum no master haver atletas com força isométrica bem alta. Tem um atleta com quem treino que até brinca e chama isso de “força de velho”. A explicação fisiológica vem desse modelo tático que cada um usa com bastante isometria e também da maturação e densidade muscular que chega ao auge entre 30 e 40 anos. Por exemplo, os top do fisiculturismo atingem os seus melhores resultados depois dos 30. E isso se deve ao alcance de uma certa maturidade muscular que vem após 7 a 10 longos anos de treinos com pesos. Na parte do treinamento para quem é master, pensar em algo com isometria vai ajudar bastante.

4- Lesões

Os adultos têm o ritmo de treino mais forte, com mais velocidade e com uso de posições técnicas como a 50/50, que fazem muitas torções no joelho. Já com os masters existe uma outra problemática: o processo de envelhecimento aliado a uma cultura na qual “treinar com dor fortalece o espírito do guerreiro”. 

Quando o atleta já tem por volta de 40-50 anos, é provável que possua algumas lesões crônicas e mal curadas. Temos, portanto, uma combinação perigosa para o aumento do risco de lesões em ambas as categorias e por motivos diferentes. Com o treinamento as principais preocupações são o fortalecimento e o controle da fadiga diária. Essa fadiga nos adultos é gerada pelo acúmulo de treinos e nos masters pelo somatório de responsabilidades diárias (treino, trabalho, família). 

Como falei no tópico anterior, alguns modelos táticos ou técnicos que exigem mais flexibilidade não são uma boa opção para os masters. 

Aliás, uma recomendação para os veteranos é usar eventualmente alguns treinos de DSE (Desenvolvimento de Sistemas Energéticos), popularmente chamados de “cardio”. Usar esse tipo de estratégia vai deixar o atleta no gás e menos exposto ao risco de lesão que uma sessão intensa de BJJ oferece. É a famosa relação de custo/benefício.

5- Recuperação

Neste quesito, uma dica que realmente faz a diferença é o trabalho de fisioterapeutas manuais. Como falei no tópico anterior, os dois públicos (adultos e veteranos) têm altos riscos de lesões, por motivos diferentes. No entanto, ter um fisio vai ajudar bastante no processo de recuperação muscular ou mesmo no controle de lesões crônicas. Outra dica que vale ser mencionada é o monitoramento da Variabilidade da Frequência Cardíaca (VFC). Isso me dá um gráfico diário, a partir do qual ajusto o treino do dia a fim de controlar a fadiga do atleta. 

6- Volume de treino

Este ponto é crucial para o sucesso e longevidade do treinamento. Pegue todos os outros tópicos, misture no liquidificador e agora ache a razão ideal de treino para cada atleta. Essa realmente é uma tarefa quase que impossível de realizar. O que fazemos é na verdade ir construindo com cada atleta ao longo do tempo a relação ideal entre necessidade da quantidade de treino e de descanso. 

Fomos educados a acreditar que, quanto mais treinamos, melhores ficamos. Essa é a cultura do alto volume. O que acaba indo contra a intensidade do treino. Pense: você consegue treinar mais forte num rola de 5 ou 50 minutos? Quanto maior o tempo de treino, menor a intensidade dele. 

A ciência do treinamento e os resultados de atletas olímpicos estão aí para provar que não é somente o volume que resolve. Atletas da natação, por exemplo, hoje nadam 25% do volume que se praticava na década de 1970. Achar essa relação ideal entre volume e intensidade, levando em conta cada perfil, é o mais importante. 

Ah, claro, dentro desse terreno de relatividades, posso ao menos afirmar uma coisa com convicção: o volume total de treino de um atleta master deve ser menor que o de um atleta adulto.

7- Viagens

Enquanto o problema dos adultos é conseguir verba para custear as viagens competitivas, os veteranos precisam arrumar tempo na agenda para isso ocorrer. Geralmente os masters são profissionais já bem estabelecidos em suas áreas ou mesmo ex atletas que agora são professores e donos de suas próprias academias.

8- Comprometimento 

Por incrível que pareça, a disciplina e o comprometimento dos atletas masters tendem a serem  maiores do que os dos profissionais. Isso se deve muito ao nível de maturidade, é claro. Outro ponto é que os masters sabem que precisam fazer o mais perfeito possível para compensar a falta de tempo ou mesmo os sinais eminentes do envelhecimento. Hoje trabalho com 85 atletas de diferentes níveis dos quais 33 são profissionais. De todos esses atletas, existem três masters entre os Top 5 nesse quesito. E isso é algo que dá bastante prazer ao treinador e acaba virando uma “bola de neve” com ações positivas. Costumo dizer a todos que quanto mais informações e mais detalhes o atleta me passa, mais fundo conseguimos ir na individualização do próprio treino dele.

* Rafael Ribeiro é preparador esportivo de atletas amadores e profissionais, com foco em MEC (Modalidades Esportivas de Combate) e surfe. Ministra cursos de extensão e pós-graduação. Foi responsável pela preparação esportiva de profissionais de Jiu-Jitsu como Isaque Bahiense, Mahamed Aly e Pedro “Paquito” Ramalho e Michael Langhi, entre outros campeões. Instagram: @rafaribeirojj

 

 

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