Do baú: um Shogun quase famoso

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O sucessor de Wanderlei Silva. Era assim que, em 2003, na GRACIEMAG #81, os mestres da Chute Boxe avaliavam Mauricio “Shogun” Rua, o menino prodígio de apenas 21 anos que honrava a equipe com um estilo frenético em pé e títulos no Jiu-Jitsu esportivo. Comprovando que de Shogun a equipe da Editora GRACIE entende, ele este mês retorna à capa de NOCAUTE, em reportagem especial sobre a revanche contra Lyoto Machida. Confira aqui mais esta do nosso baú, e depois corra até a banca mais próxima e entenda como pensa Shogun hoje.

Shogun na casa dos Rua, no Paraná. Foto: Gustavo Aragão/2003.

A Parati vermelha de Mauricio “Shogun” está tão avariada quanto os adversários que o lutador costuma espancar nos ringues de vale-tudo. Pára-brisa rachado, retrovisor pendurado, lataria cheia de mossas. Assustados, o repórter e o fotógrafo de GRACIEMAG fazem o sinal-da-cruz e entram no veículo. Shogun vai levá-los para conhecer a casa onde mora, no modesto bairro de Bacachiri, zona norte de Curitiba. Apesar do pé enfaixado (consequência da luta contra Renato Babablu, no último IFC), o motorista pisa fundo. O trajeto passa tão rápido quanto a meteórica carreira de Shogun, que em menos de um ano como profissional já foi escalado para o concorrido Pride Bushido. Ao abrir a porta de casa, Maurício nota que há uma carta em sua caixa de correspondências: “PQP! Mais uma multa. Isso é coisa do Ninja. Assim não dá”.

Até pouco tempo atrás, Shogun era conhecido apenas como “o irmão de Murilo Ninja”. O nome, ou melhor, o apelido do lutador só se popularizou no mundo do vale-tudo na madrugada do dia 2 de agosto de 2003, quando Mauricio subiu ao ringue do Meca 9 para enfrentar o temido Evangelista Cyborg. Em pé, o representante da Chute Boxe soube assimilar os murros de seu adversário como um resistente pugilista. No chão, Shogun simplesmente esnobou: aplicou uma chave de pé, arrochou o braço de Cyborg com um armlock e ainda montou três vezes. Foi a terceira vitória oficial do curitibano, que já tinha derrotado por nocaute Rafael Capoeira e Ângelo Antonio nos Mecas 7 e 8, respectivamente.

Ao superar Cyborg, Shogun saiu da sombra do irmão mais velho e seu currículo passou a seduzir os cartolas do vale-tudo internacional. E quanto ao público? “Depois daquela luta dei meu primeiro autógrafo. É bom demais ter o trabalho reconhecido”, comemora o chuteboxer.

http://www.youtube.com/watch?v=H8bf2LHtqiY

Um mês depois da luta, Shogun viajou aos Estados Unidos para disputar o IFC – Global Domination. O casca-grossa teria que derrotar três adversários na mesma noite para se tornar o campeão do evento. A pedreira inicial chamava-se Erik Wanderley, campeão superpesado do Mundial de Jiu-Jitsu 2003, mas estreante em vale-tudo. Shogun venceu por nocaute técnico no segundo assalto. Na semifinal do torneio, Mauricio duelou contra Renato Sobral, o Babalu. A luta seguiu equilibrada até os 3min07s do terceiro round, quando Shogun bateu numa guilhotina.

Foi a sua primeira derrota na carreira. “Chorei muito no vestiário. Era o nome da Chute Boxe [ele fala Chute Boxss] que estava em jogo, entende? No dia seguinte, no voo de volta ao Brasil, eu sentei na poltrona ao lado do Babalu. Nós nos cumprimentamos e eu dei os parabéns a ele. Percebi, então, que eu já tinha superado a derrota, estou pronto pra próxima”, diz Shogun.

Celular x Entrevista

O resultado negativo no IFC não impediu que Mauricio fosse convidado a participar do Pride Bushido, dia 5 de outubro. Até o fechamento desta edição, a luta contra Akira Shoji ainda não ocorrera, mas o encanto do público japonês diante da performance de Shogun é praticamente garantido. “Ele é o tipo de atleta que todo manager quer ter em seu evento: um striker que também sabe finalizar. Se não dá para vencer os combates na trocação em pé, ele leva para o chão e dá espetáculo”, analisa o grande mestre da Chute Boxe, Rudimar Fedrigo.

O que impressiona é que Shogun não tem a graduação máxima nas artes marciais que pratica com tanta desenvoltura. Tarja azul-escuro de muay thai e faixa-marrom de Jiu-Jitsu, Shogun defende o seguinte lema: “Faixa é um pedaço de pano para amarrar kimono. Eu luto contra qualquer um, de igual para igual, afinal…” A declaração é interrompida de repente, pois está tocando o celular de Shogun:

“Fala, Bitoca! Me liga daqui a pouco, eu estou dando uma entrevista para a GRACIE”.

Que história é essa de “Bitoca”?! “Ah, é um amigo meu das antigas… A gente chama ele de Pit-Bitoca. O cara fica puto… Mas onde foi que a entrevista parou mesmo?”. Enquanto o repórter tenta refrescar a memória de Shogun, o celular toca de novo.

Desta vez, o lutador atende com voz de veludo: “Oi, neném… Eu te ligo mais tarde, tá bom? Estou dando entrevista…”

Desta vez, é a namorada, que ele conheceu num torneio de vale-tudo. No quarto de Maurício, há dois porta-retratos: um com a foto dela e o outro com a foto do lutador desfilando numa passarela. Quando não está treinando, Shogun dedica-se ao mundo da moda.

“A carreira de modelo é só um bico. Quando eu tinha 19, um cara me viu numa feira e se ofereceu para fazer o meu book. Como era de graça, eu aceitei e desde então ganho um dinheirinho com trabalhos de moda. Mas é a luta que está em primeiro plano na minha vida”, explica o “Paulo Zulu” das artes marciais.

Com 94kg e 1,82m, Shogun pretende chegar a 100kg nos próximos quatro anos e se tornar um peso pesado. “Ele vai ser o sucessor do Wanderlei”, diz Rudimar. O irmão de Ninja fica encabulado, mas faz uma retificação. “Ainda falta muita coisa para eu ser um Wanderlei. Experiência é a principal delas. Tenho que raciocinar mais durante as lutas”, avalia Mauricio, que nem lembra muito bem por que ganhou o apelido de “Shogun”. “A marca do kimono que eu usava quando comecei no Jiu-Jitsu se chamava Shogun [nome de um mitológico guerreiro japonês]. Como eu era irmão de um “Ninja”, o pessoal achou que os apelidos combinavam e a coisa pegou”, relembra o lutador, cujo celular toca novamente:

“Mas tu é chato mesmo hein, Bitoca! Pode falar agora. A entrevista acabou”.

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