Qual foi o maior sufoco da sua vida, amigo leitor?
Aquele dia em que você, sabe-se lá como, respirou, fez uso de tudo que aprendeu na vida e superou um problema que parecia sem solução?
Hoje faixa-coral, Roberto “Gordo” Corrêa não tem muitas dúvidas. Nos tatames, seu dia de cão foi mesmo aquela semifinal do Pan de Jiu-Jitsu da IBJJF, em abril de 2003.
Era para ter sido um torneio marcante e divertido – e foi, para a ampla maioria dos presentes.
O Pan estava de volta ao território californiano, estado com a maior quantidade de equipes e escolas já na época, após seis longos anos afastado da Costa Oeste. A escolha do lugar se provou acertada, e o Pan quebrou o recorde de inscritos para a época – foram mais de 900 competidores.
Não foram poucas as estrelas e as lutas eletrizantes no evento, que marcava a abertura da temporada na época, e indicava a jornalistas e torcedores quem poderia surpreender ou se firmar no esporte. Houve, como exemplo, a estupenda final do absoluto faixa-preta entre Marcio Pé de Pano e Fabricio Werdum. E as atuações de Alexandre Café, de Leka Vieira, os botes do faixa-marrom Bráulio Estima e a vitória da jovem Kyra Gracie.
Uma das maiores estrelas do torneio estava já no outono de sua carreira. Roberto Gordo lutava o Pan como faixa-preta desde 1996 e buscava o tetracampeonato na faixa-preta, sem contar a prata de 1998, quando fechara com o xará Roberto Roleta.
Aos 31 anos, Gordo já vencera todos os grandes torneios da época – como a duríssima divisão absoluto no Brasileiro, em 1997, e o seu maior título, o ouro no 1º Mundial, em 1996, quando o peso médio da Gracie Barra superou Eduardo “Jamelão” Conceição (Alliance).
Curiosamente, Gordo tomara sua primeira aula de Jiu-Jitsu aos 19 anos. Naquele Pan, enfrentaria uma estrela em ascensão, de 19 anos: Rener Gracie, filho de Rorion e dono de bons botes no joelho e pescoço.
E a luta entre eles, válida pela semifinal do peso pesado, começou quente. Rener fintou o passa-pé e puxou para a guarda fechada, enfiando a mão bem fundo na gola.
Gordo comentaria o aperto, em artigo escrito pelo correspondente Kid Peligro e equipe GRACIEMAG:
“Quando o Rener deu o primeiro estrangulamento, me defendi, só que ele ganhou uma vantagem. Então, quando tentou o segundo, pensei: não vou deixar encaixar, porque não posso ficar tomando vantagem. Encolhi o braço esquerdo para segurar o pulso dele, e ele atacou o triângulo. Quando fui fazer postura, ele empurrou meu cotovelo e o meu braço direito entrou, deixando o golpe no aperto máximo”.
O que se viu, a partir dali, foi um momento histórico no Jiu-Jitsu esportivo. O neto de Helio Gracie com a armadilha fechada. O notório campeão, um dos reformuladores da técnica de meia-guarda, resistindo com tudo o que tinha, e o que não tinha. Puro espírito do Jiu-Jitsu.
Gordo recordaria o sufoco que viveu por cerca de 4min45, ali pelos 2min aos 7min de luta:
“Dentro do triângulo, eu segurei o joelho, para diminuir o arrocho, e ele atacou mão-de-vaca, chave de braço e ajudou o estrangulamento algumas vezes com o próprio braço. Nessa hora, o arrocho ficava maior, mas eu fingia não estar sentindo e ele soltava um pouco. Resisti o quanto pude e, quando já não estava tão otimista, ele soltou. Acho que ele cansou as pernas.”
O colecionador de ouros do Pan então respirou e trabalhou a passagem de guarda clássica, na pressão, conquistada no finzinho do duelo. O faixa-preta de Carlos Gracie Jr depois refletiria sobre a rara façanha, que arrancou aplausos de pé dos presentes na Universidade de Santa Bárbara:
“Foi o maior sufoco que eu já passei na minha vida, e não só em campeonatos. Porque, num treino, não faria sentido resistir – eu já teria batido há muito tempo.”