No início de setembro, um curioso andava pelo centro do Rio quando notou dois jovens amigos num debate acalorado. Seria futebol? Política? O aquecimento global? O curioso se aproximou e ouviu:
– Você acha que o Preguiça vence? Será que dá para ele? Eu não sei!
De fato, o tira-teima está na boca do povo. Tudo começou com o desafio de Felipe Pena, o Preguiça, para Nicholas Meregali, o mais autoconfiante campeão de Jiu-Jitsu dos últimos tempos.
A “treta” começou no Instagram, quando Meregali levantou a peteca que estava sem adversários. Pena se ofereceu e a coisa esquentou. Nicholas se prontificou a lutar com Preguiça de kimono, mas Felipe aumentou a aposta: propôs uma disputa com e sem kimono.
A aguardada luta entre ambos quase rolou no Mundial 2021 da IBJJF, mas foi adiada por um dedo – o dedão do meio que Nicholas Meregali ergueu para um torcedor, durante a semifinal do peso pesadíssimo, o que o desclassificou da final do absoluto contra Preguiça.
Como e quando se daria esta guerra de gigantes? O mineirinho quieto Felipe poderia calar o gaúcho provocador Nicholas?
Foi o que perguntamos ao professor Vinicius Draculino, treinador que consagrou o apelido de “Preguiça” e conhece a fera formada pela GB desde a faixa-branca. Confira como ele avaliou o desafio.
GRACIEMAG: Pela sua experiência e trânsito nos bastidores, você crê que este desafio sai do papel?
VINICIUS DRACULINO: Tem tudo para ser uma luta épica. Os dois jogam para a frente, são atletas incríveis e têm uma técnica assombrosa. E tem esse lado pessoal para apimentar. Até onde eu vejo, eles parecem não se gostar muito. Hoje o público nunca tem muita certeza, pois existem rivais das artes marciais que se provocam de modo pesado, destilam aquele ódio, mas no privado se falam na boa e o fazem para aumentar a expectativa. No caso deles, não me parece ser teatro, pelo que ouço dos amigos em torno. É o grande duelo que o povo quer ver, afinal eles são dois dos melhores lutadores peso por peso hoje. Acredito sim que vão entrar em rota de colisão em breve.
Você acha que Felipe tem plenas condições de superar Meregali tanto com pano como sem o kimono, após esses treinos todos do Nicholas no esquadrão de John Danaher?
O Preguiça vem da nossa linhagem, na equipe Gracie Barra-BH, e a gente sempre vai apostar nos nossos galos. Ainda mais por conhecermos o Felipe e sabermos a capacidade que ele tem de crescer em campeonatos. É um campeão que se agiganta na hora da arena. Tanto o Felipe quanto o Nicholas podem vencer com e sem kimono. Quem estiver num dia melhor, com a luz do sol em cima, pode ser o vencedor. Os dois jogam para finalizar, sem muita estratégia ou amarração, então nenhum resultado vai surpreender. O que vai contar muito é a pujança física, quem estiver com mais gás no tanque vai ter mais condição de sair com o braço levantado. Ainda mais que as regras dos combates ainda não são conhecidas, então pode ser sem tempo, sem pontos, quem sabe. O preparo físico portanto para mim será decisivo.
Você é um ferrenho opositor às provocações exageradas e desrespeito pessoal no meio das artes marciais. Meregali tem sido apenas sincerão ou tem cruzado alguma linha da falta de esportividade?
Eu não conheço bem o Meregali pessoalmente. Não sei se o tom dele é para vender mais lutas, ou se vem dele mesmo. Na minha visão a pessoa pública pode fazer aquele teatro nas redes sociais para promover um pouco a sua imagem, claro, mas a falsidade e hipocrisia são aspectos que me incomodam. Mas eu acredito que o Meregali seja autêntico. Eu admiro as pessoas que se mostram como elas são. Pelo que lembro, o Nicholas é meio poderoso mesmo desde as primeiras conquistas, na faixa-roxa (risos). Isso não me incomoda, se ele mantém o respeito com os desafiantes. Sobre o Jiu-Jitsu dele, acho fenomenal – sou fã do jogo dele, completo e finalizador.
Tecnicamente, vê o Meregali como um dos maiores da história da IBJJF, no panteão de um Roger, Buchecha, Jacaré, Xande, Gordon e outros raros lutadores da divisão masculina?
Acho que ele tem condições de escrever seu nome nesse panteão aí. São nomes excelentes, eu incluiria ainda o Marcelinho Garcia. Mas creio que ele ainda tem um certo caminho a trilhar antes de chegar lá. Ele tem condições? Sim, totais. Mas qualquer pessoa de bom senso vê que ele ainda não chegou ao patamar desses campeões. Ser apontado como um dos melhores da história exige consistência, títulos em eventos gigantes e sob diversas regras. E, se bobear, tentar se testar no MMA para ver como ele responde quando a porrada entra ali no ringue. Acho que ele pode, sim, virar uma lenda do Jiu-Jitsu. Mas por enquanto é jovem, e ainda tem que comer muito arroz e feijão até chegar lá.