Sentados num grande salão celestial, Odin e Ares sorvem suas respectivas tigelas de açaí enquanto se engajam em animada discussão. Odin, o “Pai de Todos” e “Senhor da Guerra” dos deuses nórdicos, vira-se para o “Deus da Guerra” da mitologia grega e brada:
– Essa aposta está no papo. Dessa vez não tem como você me vencer!
– Você disse isso da última vez… – replica Ares, com ironia.
– Você está falando de 2010? Como eu ia adivinhar que o falastrão do Sonnen não seria capaz de resistir uns parcos segundos naquele triângulo? Ele estava com aquela luta com o Anderson Silva ganha!
Ares solta uma gargalhada profunda e tripudia:
– Isso é que dá apostar contra o campeão dos campeões. O “Aranha” tinha uma velocidade de esquivas de fazer inveja a Hermes, o Deus Grego da Velocidade. E vou além: sua precisão era talvez maior do que as flechas de Artemis, a Deusa Grega da Caça. É disparado meu campeão favorito.
– Pode ser. Mas acontece, caro Ares, que botar todas as fichas num grande nome nem sempre é certeza de vitória. Não se esqueça que você ainda me deve um barril de hidromel por causa daquela luta do Mike Tyson com o Holyfield.
– A da dentada na orelha?! – Ares leva a mão à testa e dá um suspiro profundo. – Como um sujeito é capaz de morder a orelha de outro num ringue, Odin? Até hoje não acredito que ele fez isso. Se fosse na época do Coliseu, maravilha. Em Roma as regras eram mais flexíveis…
Com uma piscadela de seu único olho, Odin fala em tom professoral:
– Pois é, Ares. A verdade é que você precisa se adaptar aos novos tempos. Não adianta continuar pensando com a mesma mentalidade que você mantinha na época dos gladiadores romanos…
– Eu? – replica Ares, indignado. – E você? Olhe em quem você está apostando agora! E ainda tem a cara de pau de dizer que EU tenho mentalidade dos tempos do Coliseu… Apostar em Paulo Borrachinha contra Israel Adesanya, francamente, é insistir nos brutamontes vikings que você tanto inspirou a atacar a Inglaterra. Esse tempo já era, meu bom Odin.
– Aí você se engana duplamente, meu velho. Meus vikings eram muito mais que brutamontes. Eram estrategistas notáveis, mestres em navegação e possuíam estruturas sociais mais avançadas do que os ingleses e franceses da época. Praticamente uns cientistas. Já em relação ao brasileiro Paulo Costa, ele é bem mais do que força bruta. Poucos lutadores evoluíram tanto no UFC nos últimos anos. Ele melhorou muito a precisão dos golpes e tem uma bela técnica de wrestling, lapidada pelo professor Eric Albarracin. Somente um grego maluco como você para achar que o magrelo Adesanya vai ganhar essa luta.
– Magrelo não; esguio.
– Dá na mesma – diz Odin, revirando o olho.
– Deixe eu te explicar uma coisa? – interrompe Ares – Israel Adesanya tem um ótimo biótipo para o MMA. Por ser magro, é alto para a categoria, possui grande envergadura e é muito rápido. Isso permite que ele tenha ótimo deslocamento e esquivas aceleradas, seguidas de contragolpes velozes. Ou já esqueceu daqueles que derrubaram o Robert Whittaker? Ele é muito melhor que o Borrachinha, que tem a guarda aberta e defende boa parte dos golpes com o queixo…
– E que queixo! – exalta-se Odin. – Borrachinha absorveu os socos de Yoel Romero e continuou golpeando até vencê-lo. Poucos sabem, mas Yoel é um descendente distante dos Gigantes de Jotunhein. Nem Adesanya sobreviveria aos golpes que o Paulo recebeu naquele UFC 241. Por isso Israel ficou fugindo do Romero a luta inteira. Com Borrachinha é outro papo. O brasileiro vai partir sem medo para cima do Israel, pressioná-lo contra a grade, retirar o espaço para as estripulias dele, derrubar e esmurrar até o juiz interromper a luta.
Ares abana as mãos, em discordância:
– Borrachinha não vai conseguir encontrar meu campeão no octógono. Adesanya tem mais técnica e volume na luta em pé. Vai misturar socos, chutes e cotoveladas plásticas com seu ótimo controle de distância para ir minando e frustrando o seu guerreiro. O brasileiro não vai nem ver de onde virão os golpes. Não sei como você pode não gostar de um lutador como ele. Adesanya tem muito mais estilo!
– Estilo até demais, né? – grunhe Odin. – Cabelo rosa?
Ares sorve sua bebida. Depois de alguns segundos em silêncio, o deus grego chacoalha a cabeça e volta à carga:
– A verdade, meu bom Odin, é que Adesanya é nigeriano e aquele povo não se entrega fácil. Não vai ser qualquer porrada do Borrachinha que vai intimidá-lo.
– Sim, mas e os brasileiros? Sou grande fã dos gladiadores tupiniquins no MMA, desde que cravei que Royce Gracie ia finalizar Kimo Leopoldo, e você duvidou… – diz Odin, com grande sorriso no rosto.
– Ih, só falta você cantar de novo aqueles gritos de guerra… Não começa.
Odin levanta a voz e entoa, provocador:
– “Ah, sou brasileiro… Uh, vai morrer! Uh, vai morrer!”
– Tomara que esse UFC 253 chegue logo – conclui Ares, engolindo o resto do açaí, enquanto Odin continua a cantar, excitado, e ondas gigantes apavoram a Escandinávia.
UFC 253
Ilha da Luta, Abu Dhabi
26 de setembro de 2020
Israel Adesanya x Paulo “Borrachinha” Costa
Dominick Reyes x Jan Blachowicz
Hakeem Dawodu x Zubaira Tukhugov
Kai Kara-France x Brandon Rovyal
Diego Sanchez x Jake Matthews
Brad Riddell x Alex da Silva
Shane Young x Nate Landweh