Figura importante para o esporte na Cidade de Deus, comunidade no Rio de Janeiro, o paraense Marcio De Deus é um homem realizado aos 39 anos. Há 10 anos, o faixa-preta da Infight abria seu primeiro projeto de academia no anexo de uma igreja para mudar a perspectiva de crianças e jovens carentes da sua região. A sua fé mostrava o que ele viveria hoje mesmo que a realidade pudesse mostrar, de fato, ao contrário. Hoje, em 2019, Marcio colhe os frutos de uma dedicação e profissionalismo.
No anexo de uma igreja, ele foi capaz de montar um centro de treinamento planejado e projetado por suas ideias e mãos. Agora com sua própria escola, conhecida como Team Marcio De Deus (TMD House), o professor segue desenvolvendo sua metodologia de ensino e exportando atletas para os Estados Unidos e Japão.
Nesta entrevista, Marcio destaca lições de crescimento pessoal, conta como o Jiu-Jitsu é forte como ferramenta social e projeta sucesso dos alunos como, por exemplo, a sua maior estrela Gabrielle Pessanha.
O que você lembra do seu início no Jiu-Jitsu e como esta ferramenta de desenvolvimento pessoal fez diferença na sua vida?
Então, eu lembro bem de tudo, lembro bem mesmo. O início isso se deu por conta de eu estar com problemas de saúde e problemas emocionais, porque meu primeiro casamento tava numa situação muito difícil e minha esposa estava muito doente. Ela teve uma doença rara e incurável chamada lúpus eritematoso. Ela veio a falecer e em meio a isso tudo, desses problemas todos, eu tinha apenas 25 anos. Foi por conta desse causo que eu me interessei pelo Jiu-Jitsu. Tinha uma academia aqui na praça da Cidade de Deus com o professor Kléber Silvino e eu decidi me inscrever. Como eu não tinha dinheiro para comprar um kimono, eu apenas ia nas aulas sem kimono (NO GI) e assim comecei a conhecer meu esporte favorito. O Jiu-Jitsu foi meu remédio, foi a ferramenta que reergueu minha vida, que me tratou e me curou. Talvez eu não estivesse aqui senão fosse o esporte. Eu passava a maior parte do meu tempo dentro da academia e nesse tempo decidi que essa seria a minha profissão para sempre na minha vida. Fui de branca a preta sem pular etapas, treinando duro, estudando e competindo.
E a vocação para ensinar foi algo que surgiu ou já era um sonho?
Quando eu peguei a faixa-roxa foi quando surgiu a oportunidade de ministrar aulas no fundo da igreja Maranata, o pastor também praticou Jiu-Jitsu por um tempo na adolescência dele. Foi dentro da igreja que surgiu o projeto social “Lutadores de Cristo”, onde ministrei aulas com a autorização do meu professor Kleber e da escola Infight. Era uma sala pequena composta por papelão, uma sala que dava apenas para ter um treino por vez. As paredes eram mofadas e tivemos que fazer até uma pintura na época. Tudo foi bem complicado. Lembro que meu primeiro banner de Jiu-Jitsu foi numa folha A4, que imprimi numa Lan House da época (risos) e colei na parede para divulgar os dias e horários de treinos. Hoje, em 2019, 10 anos depois, tenho minha própria academia, diversas filiais, diversos títulos importantes e sigo trabalhando. Sou realizado. Hoje posso viajar o mundo através do esporte, sou árbitro internacional… A história é longa. Nossa academia ainda tem a parte do projeto social bem viva. Hoje podemos providenciar para as crianças kimono, inscrição de campeonatos e outras ajudas particulares. Minha missão aqui é sempre além do dojô, foi para isso que Deus me chamou. O Jiu-Jitsu tem mudado as vidas que passam por aqui e tem diversos exemplos com a Gabrielle Pessanha, Victor Lima e Luciano Alex. Fico feliz por ser, de alguma forma, referência para a minha comunidade.
Como o Jiu-Jitsu transforma o praticante na sua visão?
Eu penso que os alunos precisam experimentar coisas boas. Eles precisam falar bem, se vestir bem e comer bem. Isso é excelência, eles buscam uma vida de excelência que o Jiu-Jitsu pode proporcionar. Quando viajamos para os Estados Unidos ou Europa nós vemos muita melhoria na prática e isso tem a ver com metanoia, uma mudança de mente. O Jiu-Jitsu transforma você para melhor, dentro e fora do tatame. Todos eles veem que para ter o sonho mais próximo é preciso estudar e trabalhar duro. Todos quem pisam no tatame são pessoas melhores nos dias seguintes. A mudança de postura é notável em todos os meus alunos depois que começaram a praticar Jiu-Jitsu.
Três dos seus principais atletas já vivem do esporte. É uma realização pessoal sua também, Marcio?
O Victor Lima, Luciano Alex e Gabrielle Pessanha ganharam mais notoriedade porque o sucesso deles é todo no exterior, mas também temos diversos campeões que deram certo aqui no Brasil. A equipe é reconhecida pelos frutos que ela gera e a TMD está cheia de bons frutos. Meu aluno Victor mora nos Estados Unidos e é responsável por comandar nossa primeira escola lá, que está em seus primeiros passos. Agora nossa turma vai ter um espaço para treinar e se sentir, literalmente, em casa. Não vamos mais precisar pedir para ficar em lugar nenhum, teremos o nosso espaço. Outro atleta que me enche de orgulho é o Luciano. Cara, ele sempre foi destaque nas faixas de base e chegou forte como faixa-preta de Jiu-Jitsu. Tem títulos de expressão no Europeu, Rio Open e outros diversos da IBJJF. Sobre a Gabrielle é até difícil falar, fico um pouco emocionado. Tenho uma relação de filha com ela. Para mim, ela já é a melhor faixa-preta do mundo. Eu já falava sobre o que ela seria a anos atrás e isso tem se comprovado. Acreditei desde o início. O que mais me deixa feliz é ver o crescimento pessoal deles. Eles são exemplos para os mais novos da comunidade. A Gabi venceu o Grand Slam RJ no último fim de semana e foi uma festa. Ela é um exemplo de esperança, faz muita diferença. O diferencial da minha equipe é o amor que tenho pelo que faço. Eu já enfrentei muito desafio para está aqui.
Para o fim do ano você vai preparar uma festa de gala para coroar o sucesso da equipe?
Sim, minha equipe merece essa festa por tudo que conquistamos. Nesse fim de ano quero fazer o TMD awards, onde quero as minas de vestidos, todas bonitas, e meus meninos de blazer. Vou premiar cada um deles por todo o comprometimento durante essa temporada, vai ser uma festa linda. Já até aluguei o Centro Metropolitano de Convenções para os dias 6 e 7 de dezembro. Nossa festa de graduação vai ser excelente. Quero que meus alunos experimentem coisas boas sempre. Tudo está sendo preparado com antecedência, estou bem ansioso, confesso. Vai ser um grande momento de comunhão.
Veja a história de Marcio: