(Por: Prof. Ms. Fabricio Monteiro*)
O sistema de pontuação atual do MMA em geral segue a tradição do boxe, geralmente com três jurados (ou juízes, ou ainda árbitros laterais) que atribuem a cada round 10 pontos para o vencedor e 9 pontos ou menos para o adversário, o que tem gerado alguns resultados, no mínimo, polêmicos e duvidosos em alguns dos mais importantes eventos do mundo.
Os critérios atuais de pontuação, basicamente, de acordo com as “Regras Unificadas de Conduta do MMA” estabelecidas em 2000 pela Comissão Atlética do Estado de Nova Jersey (New Jersey State Athletic Commision – NJAC), se resumem à avaliação das técnicas dos atletas, tais como “trocações” efetivas, agarramentos efetivos, controle da área de luta, agressividade efetiva e defesa.
Porém, os jurados acabam avaliando de forma bastante subjetiva, estabelecendo, na grande maioria das vezes, apenas 1 ponto de diferença para o vencedor, independentemente de sua superioridade em todos os critérios ou em apenas um deles.
As características do MMA possibilitam uma incontável amplitude de técnicas, táticas, estilos e formas de lutar, o que o torna uma modalidade bastante eclética, e bem diferente do boxe. Como julgar sob os mesmos critérios, por exemplo, quando um atleta especialista em muay thai golpeia mais utilizando punhos, cotovelos, joelhos e pernas contra um especialista em Jiu-Jitsu que consegue levar algumas vezes para o chão, utiliza bem a sua “chuva de pedras” ou ground and pound (golpes traumáticos desferidos de cima para baixo no solo), ou quando este cria algumas oportunidades de aplicação de torções ou estrangulamentos? E se os dois alternam vários bons momentos durante o round? Como julgar essa luta?
Tenho identificado como um dos problemas dessa subjetividade de critérios a própria compreensão do que é uma boa luta para cada jurado. Cada um acaba julgando de acordo com a sua visão do esporte, ou seja, de acordo com seus próprios critérios.
Imaginem agora um novo sistema de pontuação, com seis critérios que devem ser considerados separada e independentemente, buscando maior objetividade e clareza. São basicamente os mesmos estabelecidos pela NJAC, mas acompanhados da proposta de julgá-los separadamente, da seguinte forma:
– Domínio em pé (“trocação”, striking): Pontuar o lutador que desfere mais golpes, que leva mais perigo ao adversário, que impõe mais a sua técnica e que demonstra um maior e melhor repertório, explorando boas combinações de golpes com membros superiores e inferiores.
– Quedas (takedowns): Pontuar o atleta que consegue derrubar o adversário mais vezes e com maior eficácia para forçar a luta no chão, ou aquele que consegue se defender com eficiência das investidas de quedas do adversário.
– Domínio no solo (grappling): Julgar o domínio das ações separadamente dos acontecimentos em pé. Devem ser consideradas as passagens de guarda com sucesso gerando posições de superioridade, os golpes colocados em ground and pound, as aplicações de torções e estrangulamentos (chaves) levando perigo ao adversário, bem como as reposições de guarda, as reversões (raspagens) e as defesas eficazes de chaves.
– Efetividade dos golpes: Pontuar o lutador com o maior número de golpes duros que efetivamente atingem o adversário, que o ferem e o abalam visivelmente, tanto na “trocação” quanto no solo, considerando inclusive os knockdowns conquistados na luta em pé.
– Agressividade: Pontuar o atleta que luta se movendo para frente, buscando mais a luta, procurando cercar o seu adversário, levando maior perigo a cada investida, aceitando a luta franca e golpeando com ímpeto. Ou, no chão, o lutador que age mais, que alterna movimentos de passagem de guarda e golpes duros e que procura com eficiência reduzir o espaço e impedir a movimentação do adversário.
– Domínio da área de luta (ringue ou grade): Pontuar o atleta que controla o ritmo e o posicionamento na luta, que se movimenta melhor, que define o desenvolvimento da luta, em pé ou no chão; que, quando está em pé, estabelece a distância e impõe os deslocamentos, e quando está no chão, utiliza o espaço a seu favor. Deve ser considerado também o domínio dos movimentos em clinche (lutadores agarrados em pé procurando colocar golpes de curta distância, como joelhadas, ou obter posições de vantagem).
Uma vez avaliados separadamente cada um desses critérios, os jurados poderiam então atribuir, round a round, 1 ponto para o lutador que desenvolve melhor cada um deles, ou 1 ponto para cada um em caso de equilíbrio, ou ainda 0 no caso de nenhum dos atletas utilizar técnicas correspondentes satisfatoriamente.
Por exemplo, o Lutador A foi melhor na trocação de golpes em pé, atingindo mais, foi mais agressivo e controlou melhor a área de luta. Seu adversário, porém, o Lutador B conseguiu duas quedas e foi melhor no chão, aplicando um golpe muito forte no ground and pound que o abalou.
No caso dessa luta hipotética, temos 1 ponto no domínio em pé, 1 ponto de agressividade e mais 1 ponto no domínio da área de luta, totalizando 3 pontos para o Lutador A. Já o Lutador B consegue 1 ponto de quedas, 1 ponto no domínio no chão e 1 ponto pela efetividade, também marcando 3 pontos. Temos, então, um empate em 3 a 3 nesse round.
Dessa forma são disputados 6 pontos em cada round, que pode terminar até com empate em 6 a 6 no caso de equilíbrio em todos os critérios. Mas no caso de uma luta equilibrada, porém com um dos atletas conseguindo uma queda a mais, ele vence o round por 6 a 5. E, caso haja uma grande superioridade, com um dos lutadores “atropelando”, “passando o carro”, levando vantagem em todos os critérios, ele pode vencer o round por até 6 a 0.
Essa nova proposta tem como meta contribuir para o desenvolvimento e para a evolução das regras já conquistadas para a modalidade. Mas reconheço que deve fazer parte desse crescimento e dessa evolução, que são constantes, o rompimento com o método de pontuação do boxe, fazendo surgir um próprio do MMA.
Caso os grandes eventos americanos ainda não estejam aptos a adotar o novo sistema de pontuação, isso não impediria que, mais uma vez, o pioneirismo brasileiro nesse esporte marcasse presença. Uma iniciativa como esta serviria como referência importante, em pouco tempo, para todos os grandes eventos do mundo. O Brasil já é o país do futebol e, além disso, temos o Jiu-Jitsu e a capoeira. Talvez já seja mesmo tempo de entrarmos de vez na luta para sermos novamente, de fato, o país do MMA!
* Mestre em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), instrutor de kung-fu Garras de Águia, coordenador e docente do curso de graduação em Educação Física da Estácio UniRadial, professor de Educação Física da rede pública municipal de São Paulo e conselheiro Regional do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo (SINPEEM). Email: fa.mont@hotmail.com e www.twitter.com/@fabriciomont .